Política de Direitos Humanos e Empresas deve criar obrigações para impedir violações
CUT, em conjunto com organizações parceiras, debateu o que é necessário para que o país construa uma Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas, para que o direito econômico não esteja acima do social
O que é preciso fazer para barrar a cultura corporativa, cujo lucro é colocado acima da vida e da dignidade humana? Nessa terça-feira (28) a CUT, em conjunto com organizações parceiras, debateu o que é necessário para que o Brasil construa uma Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas.
O seminário “O Projeto de Lei 572/22 como embasamento para a Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas” ocorreu de forma online e está disponível no canal do YouTube da entidade. O seminário é uma prerrogativa do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania para que organizações da sociedade civil contribuam com a política nacional.
A secretária nacional de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara, afirmou que é preciso aproveitar a janela histórica que o Brasil vive hoje, cuja primazia é das forças progressistas, para que a Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas faça parte de um calendário social do país.
“Estamos observando um volume grande de crimes sociais e ambientais de responsabilidade das empresas, e que muitas vezes conta com a conivência do Estado. E quando digo Estado não estão falando de governos, o que eventualmente também ocorre, mas das estruturas do Estado mesmo, como órgãos de fiscalização”, disse a secretária.
Para Jandyra, casos como os das barragens de mineração em Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, envolvendo empresas como Samarco e Vale do Rio Doce, são emblemáticas para mostrar “que o direito econômico não pode estar acima dos direitos sociais e humanos”.
O argumento corroborou o ponto levantado pela representante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Paula Góes. “A prioridade dos Direitos Humanos sempre deve ser a vítima. Por isso, precisamos de uma agenda sólida que dê conta das tragédias anunciadas. Aquelas que ocorrem por imperícia das empresas e conivência do poder público”, disse.
Paula acrescentou, ainda, que a política nacional precisa dar conta de impedir que violações ocorram e que também voltem a acontecer, justamente como foram os casos das barragens mineiras, e lembrou a lentidão das empresas envolvidas em reparar as vítimas e a degradação causada nas cidades e no meio ambiente.
Para isso, os debatedores entenderam como ponto comum que a Política Nacional de Direitos Humanos deve, antes de tudo, criar obrigações para as empresas, e não somente diretrizes de punição.
“A gente sabe que uma nova política por si só não vai mudar a realidade. As punições quem faz é o Direito, mas as leis ajudam a dar força a outros marcos e favorecem as responsabilizações”, afirmou Andressa Soares, do Amigos da Terra Brasil.
Agora, após o seminário, as organizações (CUT, Amigas da Terra Brasil, Movimento de Atingidos por Barragens e Fundação Friedrich Ebert no Brasil), irão elaborar uma relatório para Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. Até aqui, a CUT já se encontrou em três ocasiões com representantes do governo federal para discutir o tema.
Para a CUT, as empresas devem promover, respeitar e assegurar os direitos humanos no contexto de suas atividades, pautando sua atuação pelas seguintes diretrizes:
Não praticar qualquer ato de colaboração, cumplicidade, instigação, indução e encobrimento econômico, financeiro ou de serviços com outras entidades, instituições ou pessoas que violam direitos humanos.
Respeitar todas as normas internacionais e nacionais que proíbem a discriminação, em particular por motivos de raça, cor, gênero, orientação sexual, religião, opinião política ou atividade sindical, nacionalidade, origem social, pertencimento a um povo ou comunidade, deficiência, idade, condição migratória ou outra que não guarde relação com os requisitos para desempenhar um trabalho, devendo ainda aplicar ações positivas antidiscriminatórias.
Respeitar todas as normas internacionais e nacionais que proíbem a exploração de trabalho infantil e em condições análogas às de escravo, em toda a cadeia produtiva.
Respeitar os direitos territoriais e de autodeterminação dos povos indígenas, quilombolas e das comunidades tradicionais, assim como sua soberania sobre os recursos naturais e sobre a riqueza genética local, em conformidade com a Convenção nº 169 da OIT, especialmente o direito de consulta.
Respeitar o direito de consulta prévia e participação efetiva dos trabalhadores e trabalhadoras, seus representantes e entidades sindicais representativas em processos que potencialmente venham a impactar significativamente os direitos trabalhistas.
Respeitar os processos coletivos, as associações, entidades sindicais, organizações, movimentos e outras formas de representação próprias dos trabalhadores e trabalhadoras, das comunidades, defensores e defensoras de direitos humanos, enquanto sujeitos legítimos no estabelecimento de diálogo e defesa de interesses dos que tiveram seus direitos violados ou sob ameaça de violação.
Publicar, em local de fácil acesso, a estrutura da gestão corporativa e suas políticas de promoção e defesa dos direitos humanos e informar quem são os responsáveis pela tomada de decisões e seus respectivos papéis na cadeia de produção.
Em caso de atividades de risco, assegurar a participação dos trabalhadores e das trabalhadoras, bem como das pessoas e comunidades atingidas, na elaboração, gestão e fiscalização de planos de prevenção.
Criar mecanismos de viabilização material da participação comunitária, principalmente das lideranças, na tomada de decisões acerca dos processos de reparação e compensação de danos, estando incluído o transporte e a alimentação durante os eventos destinados à consulta popular.
Na hipótese de identificação de violação em andamento na cadeia produtiva, cessar imediatamente a atividade ou agir para que a violação cesse imediatamente, por meio de sua influência nessa cadeia de produção.